A Cia. Troada retoma suas atividades e se prepara para a primeira apresentação do ano no SESC São José dos Campos, dia 17 de fevereiro, quinta-feira, 21h.
Encerramos 2010 após a temporada no Centro Cultural São Paulo e recebemos, carinhosamente, alguns comentários belíssimos. O retorno de pessoas que assistem o espetáculo com sugestões, críticas ou puras impressões, é muito rico para a Cia. Troada!
Compartilhamos abaixo algumas impressões sobre A PORTA. E aguardamos outras!
Feliz 2011 a todos!!!
Forte abraço,
Cia. Troada.
Estou nervoso. Amanhã
tenho uma prova teórica do processo seletivo do doutorado em cênicas. Eu
deveria ir para a cama. Eu deveria descansar para ter uma boa noite de sono.
Talvez eu tenha medo dos sonos intranqüilos se não escrever o que está na minha
cabeça. Fui ao CCSP no domingo ver sozinho o espetáculo "A Porta".
Quando digo que fui ver sozinho me refiro à ausência de acompanhantes. Afinal,
a casa estava cheia com uma platéia atenta aos maravilhosos desempenhos dos
atores da Cia. Troada. Como posso dormir hoje sem escrever sobre as máscaras da
Elisa, a luz do Du, a direção do Vina e a voz do Ravel? Não quero esquecer. Não
quero deixar passar. Todos estes amigos são muito queridos, artistas
talentosos, pessoas que admiro e respeito por suas escolhas. Talvez a minha
maior emoção tenha sido provocada pela lembrança do curso de máscara que
fizemos há mais ou menos dez anos. Era uma turma especial, reunida para
aprender com Tiche e Ésio no Barracão Teatro, em Barão Geraldo. Me lembrei
também de ver o ator Vina e a atriz Elisa com suas meias máscaras expressivas
em uma praça neste mesmo Barão. Me lembrei de tudo isto ali na platéia durante
o espetáculo, imaginando o que passaram estes artistas até aquele novo momento
que eu testemunhava. Mas posso estar enganado porque toda memória carrega sua
confabulação. Esta "memória confabulatória" me foi apresentada em uma
conferência de James Fentress no SESC Vila Mariana em 2006. O que pode ser
também uma lembrança inventada pela minha memória. Não que eu não tivesse inventado
memórias pessoais e coletivas anteriormente (quem não inventou?), mas acreditar
nestas memórias como verdadeiras seria algo muito arriscado. A memória ativa e
criativa é um desafio ao nosso entendimento do passado e isto se reflete no
nosso presente. Se olhada como uma dramaturgia biográfica ela se torna um
poderoso instrumento para a construção de uma personagem, de suas falas, seus
figurinos e, até mesmo, de seu final "feliz". Eu acreditei no teatro
do ator tomado pelo personagem perdido pelas ruas de São Paulo, e acho que o
melhor é sempre duvidar do que pensamos ser real. Acho que foi o Quintana quem
disse algo como a mentira ser uma verdade que se esqueceu de acontecer. Mas e a
verdade? E o real? O que são exatamente? Eu não tenho certeza, mesmo porque,
esta frase que penso ser do poeta pode ter sido apenas algo que me foi dito e
esquecido e lembrado e esquecido e.......inventado. Um lembrança do que está
por vir, ou do que desejei estar.
Paulo Renato Minati
Panzeri
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Quase uma
semana, depois que eu assisti ao espetáculo da Troada. Ainda me tocam as
imagens.
Sou um leitor assíduo do Sr. Kafka. Comecei com "A Metamorfose", numa
edição em papel jornal que a Revista Caras lançou. Além do famoso texto, havia
uma série de contos curtos. Dali em diante, tive que ler tudo o que o homem
escreveu.
Tenho sido forçadamente criterioso com os espetáculos que assisto, apesar dos
vários amigos incluídos na ficha técnica. Estamos com dois filhos pequenos, que
precisam ser despachados para a casa dos avós, em Osasco, a cada vez que
resolvemos fazer um programa conjugal. Esse movimento me enche de preguiça
várias vezes.
Encontrei a Elisa no dia da inscrição para o Mestrado na ECA e ela me falou do
espetáculo. Me deu um cartão da peça e eu me confundi mil vezes, provavelmente
irritando-a, achando que se tratava de teatro de bonecos, ou de um infantil. Eu
não estava prestando muita atenção, porque o pequeno acorda a cada duas ou três
horas na madrugada e eu não consigo repor isso durante o dia. Além disso, tinha
que voltar logo para casa, para fazer o almoço.
Comecei a ver links no Facebook com os clipes da peça e resolvi assistir a um
deles por curiosidade. "Número Trinta". Genial! Tinha o senso de
humor que eu identifico em Kafka. Tinha a dureza, a angústia, as regras
estúpidas e rígidas. A rebelião frustrada contra isso… Chamei a Clau, com o
cartão na mão, e mostrei o vídeo a ela. Disse: "Clau, vamos ver isso? É do
Vinão e da Elisa… Achei muito louco. Lembra o Fezão, que namorava a Laís na
época do Frio? Ele fez a dramaturgia."
Desde ali eu me senti o número trinta e um.
Eu sou o trinta e um e na fila estão os outros sete bilhões, sempre com alguém
na sua frente e depois de você. Sempre lidando com uma realidade tão absurda,
que o sonhar parece mais real e a única saída viável. Insones. Estamos todos
insones.
O sonho manipulado, desejando coisas que outros desejam que desejemos. Caralho!
Visualmente impecável. Lindo. A máscara traz o caráter do personagem de saída,
logrando o mesmo efeito de uma caricatura, ou de uma história em quadrinhos. A
expressão estática do protagonista, sempre surpreso. A dupla de entregadores de
documento. A secretária. A simplicidade da solução cenográfica, com elementos
perfeitamente amarrados.
Particularmente genial é a associação entre a bolinada no seio da secretária e
a cena de sexo, seguida da sedução e dos toques de campainha da cena
"Número Trinta". A campainha e o seio da secretária… A sedução e a
entrega adiada comparadas à burocracia e aos pequenos poderes. Sexo e morte.
A precisão do elenco me impressionou logo na primeira cena. A partitura
perfeita. Isso me lembrava do Belloni e do seu "Frio 36 e Meio", a
coisa mais ducaralho que eu já fiz nessa vida. Me lembrava daquela loucura
toda, de fazer a coisa exatamente no tempo da música. Me lembrava da
sensação.
Eu tinha o tempo todo a maravilhosa sensação de estar sendo iludido. Via o
truque e não sabia como o mágico estava fazendo aquilo. O ator se deitava
acompanhado na cama e quando a luz voltava, ele estava sozinho de novo. Isso me
colocava em estado de sonhar permanente. Tudo seria possível a partir
daí.
A luz do Edu era genial. Simples e maravilhosa. Aquele efeito da cadeira de
rodas na frente dos set-lights era um desbunde! Ali tínhamos o trem, sem mais
nada. As entradas da mulher de chapéu…
Porra, Vinão!
Porra, Elisa!
Porra, Troada! Que espetáculo lindo
vocês estão fazendo, hein?
Djair Guilherme
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“Há um prazer secreto na loucura que só os
loucos conhecem.”
John Dryden
Para Vinicius,
Acho
que o tempo do ser humano não é, e nunca vai ser esse tempo que nós mesmos nos
impomos. Não dá pra acompanhar, é um tempo artificial. Mas, vez em quando,
podemos parar, não o parar no sentido do sem movimento, pelo contrário, o parar
no sentido de dar fluidez ao pensamento, este viajando a uma velocidade quase
da luz e ao mesmo tempo flutuando pacientemente.
Esta
noite, diante de tal “representação” de
uma pessoa através de muitas, ou das várias facetas de uma mesma, pude parar.
Estava apreensiva, tentando absorver cada palavra sem som que estava por vir.
Uma
obra de arte não é como um fenômeno que pode ser explicado pela física. Não se
pode predizer os resultados, tão pouco alterá-los de antemão aumentando ou
diminuindo esta ou outra variável. Primeiro por sua própria natureza de ser
única, e, segundo, pela irradiação que ela pode causar em cada espectador, que
por sua vez, também é único.
Tudo
isso só pra dizer que pude mergulhar um pouco, se é que é possível, na
escuridão de um “imaginador”.
Lá
tinha de tudo um muito. Sob a sensação envolvente e um tanto quanto tenebrosa
de sua loucura, havia uma sutileza de impressões, de sentimentos vívidos,
talvez por terem estes sido estes realmente vividos. E mesmo que imaginados,
ainda assim eram reais.
Tenho
a impressão que vi um pouquinho de você em cada gesto. Sua ironia, o seu humor, as vezes
sarcástico,mas engraçado, mesmo que não me fazendo rir. Senti uma angústia
enorme, dancei com a vida e com a morte. Por alguns instantes parei, me
transportei e com certeza não voltei a mesma.
Sair
da sua zona de conforto faz bem, expande seu campo de visão. Faz você ver e
rever o significado de cada sentimento que te compõe. Não importa se foi sonho,
pesadelo, pensamento, ou uma “simples” apresentação. Foi um espetáculo!
Adriana Lima.